Manual do rebaixamento no Campeonato Brasileiro


Por Felipe Portes

 

Todo ano, vários clubes brasileiros tentam a sorte na disputadíssima Série A, mas apenas quatro ou cinco estão realmente habilitados para brigar pelo título. O resto dos participantes se limita a sonhar com vagas ou, em casos extremos, lutar contra o rebaixamento. Entre os concorrentes desta edição de 2017, somente Flamengo, Cruzeiro, Santos, Chapecoense e São Paulo não sabem o que é cair para a segunda divisão, com o agravante de que a Chape está na elite apenas desde 2014.

Dito isso, existe uma tendência forte entre os clubes grandes de eventualmente brigarem nas posições inferiores da tabela. O gigante em apuros da vez é o São Paulo, mas outros grandes parecem querer entrar nessa disputa. E o Tricolor paulista parece estar seguindo uma cartilha de erros que culminam no temido descenso ao fim do ano. Diante deste fato, é justo que citemos estas falhas reincidentes que se tornam uma bola de neve. O que chamaremos de “Manual do Rebaixamento”, em dez itens.

Elenco repleto de buracos no planejamento

O barco começa a tomar o caminho errado quando a montagem do time é feita de forma precária. Muitos medalhões ou setores com carências graves costumam cobrar um alto preço. Lesões e suspensões eventuais se tornam mais problemáticas quando o elenco é desequilibrado. Exemplo: Vasco 2013.

Crise política interna

Dirigentes que lutam pelos próprios interesses em detrimento do clube. Brigas por poder dividem o conselho e acabam envenenando o elenco, que não sabe ao certo quem é que manda. A ingerência da direção também gera instabilidade no comando técnico. Exemplo: Internacional 2016.

Resultados ruins em casa

Quando um time não consegue somar pontos em seu próprio estádio é porque a coisa está feia. A pressão da torcida ou a fraqueza psicológica começa a empurrar o clube para o buraco. E quanto maior for a equipe, mais difícil é o retorno aos trilhos, por todos os elementos envolvidos. Exemplo: Botafogo 2014.

Demissão contínua de treinadores

Como acertar o time, se toda hora o treinador muda? Além de bagunçar a cabeça dos jogadores, a equipe dificilmente encontra alguma regularidade ao longo do campeonato. Este é um fator determinante para que os resultados sejam desastrosos. Se houver mais de duas demissões no ano, é praticamente uma sentença de fracasso. Exemplo: Internacional 2016.

Virar o primeiro turno no Z4

O tempo está correndo. O primeiro turno foi péssimo e o time precisa reverter os resultados ruins, provavelmente com jogos-chave dificílimos fora de casa. A pressão aumenta a cada rodada, especialmente se as vitórias não vem. Some isso à lanterna e temos um desastre pronto para acontecer. Exemplo: Vasco 2015.

Contratações de peso para acalmar a torcida

A situação já está terrível e a diretoria resolve gastar um dinheiro que provavelmente não tem para trazer reforços que ajudem a redirecionar as atenções. Craques do passado ou estrangeiros surgem como solução para a má fase técnica. Entretanto, a bagunça é irreversível e nem mesmo os novatos conseguem mostrar algo de bom. Dependendo do tamanho do ego do jogador, ainda é possível que haja alguma desavença no elenco. Exemplo: Palmeiras 2012.

Contratação de ídolos do passado

Independentemente se no banco de reservas ou em campo, os ídolos ajudam o clube na hora de pedir paciência aos torcedores. É um exemplo clássico se apoiar neles em um momento de crise, como resposta para satisfazer os mais críticos. Como para qualquer profissional, chegar como salvador da pátria nessas horas pode ser nocivo à idolatria. Ou o próprio clube queima o ídolo, ou a torcida se encarrega disso. Exemplo: Inter 2016.

Protestos da torcida no CT e falta de apoio no estádio

O estádio vazio é um sintoma clássico do candidato a rebaixamento. Quando a torcida prefere não comparecer a passar os 90 minutos xingando ou vaiando, é porque não há mais volta. Geralmente, o time precisa de apoio maciço para superar suas limitações, algo que não acontece quando as arquibancadas estão desertas ou a torcida resolve protestar no CT com faixas e cobranças pessoais ao plantel. Exemplo: Atlético Paranaense 2011.

Salários atrasados

O grande fator impeditivo para que um jogador dê seu máximo é o salário atrasado. A política desleixada de várias equipes de grande porte causa a desorganização na hora dos pagamentos e o torcedor sente isso a cada jogo. Quando o dinheiro não cai na conta, é complicado cobrar qualquer coisa de um profissional. Mas muita gente não entende este detalhe crucial na motivação. Os casos de atraso no pagamento no futebol brasileiro estão menos frequentes nos últimos anos, mas é quase certo de que eles se somem a outros fatores preponderantes na rotina de uma agremiação a caminho da Série B. Exemplo: Vasco 2015.

Azar e vitórias suadas demais

No minuto final, o placar está em 1 a 0 para o time visitante. Os mandantes, em desespero e precisando de qualquer ponto para não se aproximarem da degola, conseguem o empate, mas o gol é anulado porque o atacante estava com o joelho à frente do marcador. No lance seguinte, já pela hora da morte, a bola bate na trave e o goleiro visitante agarra com segurança. Ainda com alguma esperança, a torcida comparece em peso para ver o seu agonizante time em mais uma jornada, fora de casa. A vitória deles, por 1 a 0, no entanto, não serve para sair do Z4. O 16º colocado também triunfou e se safou por um mísero ponto, justo aquele que escapou com a bola na trave. Mas é aquela coisa: quem cometeu tantos erros nos nove itens anteriores, não pode jamais depender da sorte…

Esporte

Felipe Portes

Jornalista, fundador e editor do site Todo Futebol, com passagens por Trivela e Yahoo Esportes.