Sonho de ser jogador


Por Ivan Drummond

Time campeão da Taça São Paulo 1976 – reprodução internet

Muita gente sonha em ser atleta, mas esse desejo, para a maior parte, acaba não se realizando. Por várias razões. Muitas vezes, pela maneira de pensar, de viver e de ser. E, em algumas delas, pela época em que tentamos colocar o sonho na prática.

Era o ano de 1975. Meu pai, Felippe Drummond, era jornalista. Desde pequeno, me levava com ele para trabalhar. Era uma forma de ajudar minha mãe e de ficar comigo mais tempo. Era da TV Itacolomi e do Diário da Tarde.

Bem, a Seleção Mineira representava o Brasil na disputa da Copa América. Era um monte de craques daqui: Raul Plassmann, Nelinho, Getúlio, Wantuir, Wilson Piazza, Zé Carlos, Reinaldo, Dirceu Lopes, Marcelo Oliveira, Roberto Batata, Palhinha, Joãozinho. Eu estava empolgado, pois iria ao treino, na Vila Olímpica. O Brasil ia enfrentar o Peru.

O técnico era Oswaldo Brandão. Além de mim, havia outros adolescentes, filhos de dirigentes do Atlético e de outros jornalistas, amigos do meu pai. Ao final do treino, os jogadores foram para o vestiário e foi a vez de nós, meninos, ocuparmos o campo e viver um certo sonho. Na época, eu estava jogando no juvenil do Villa Nova. Mas, naquele momento, estava na Vila Olímpica. Um sonho.

E passamos a brincar de cruzamentos, cabeceio e dribles. De repente, meu pai surge no gramado e me chama. Peço para esperar um pouco, mas ele foi taxativo.

– Não! venha cá.

Pergunto o que é e ele responde.

– Venha aqui. quero que conheça uma pessoa.

Me leva até Oswaldo brandão, que pergunta.

– Já jogou em algum lugar? Onde? Você cruza bem, cabeceia bem.

– Joguei e jogo no meu colégio, o Colégio Arnaldo, que tem campo e onde comecei. E estou no Villa Nova, de Nova Lima.

Para minha surpresa, o Brandão vira para o meu pai e para as outras pessoas que o cercavam e diz.

– Ele devia estar aqui.

Uma dessas pessoas era o treinador do juvenil do Atlético, Dawson Laviola, que tinha conquistado, no início daquele ano, o título da Taça Cidade de São Paulo. Ele, então, chama meu pai para uma conversa. Meu pai me chama, apresenta o Dawson e diz:

– Ele quer falar com você.

Dawson dispara, para minha surpresa.

– Você não quer vir treinar aqui? Acho que pode ser útil e que pode nos ajudar.

Topei. Na segunda-feira da semana seguinte, às 6h, estou na sede do Atlético para pegar o ônibus para o treino. E ao chegar, um jogador daquele juvenil já está lá, João Leite, que puxa conversa. Descobrimos que nossos pais se conhecem. O dele era porteiro no Estado de Minas, onde também funcionava o Diário da Tarde.

Chegam outros jogadores: Alves, Alfredo, Heleno, Marinho, Marcinho, Faísca, que já era meu amigo, Sérgio Biônico, do juvenil. E um profissional, o Márcio Gugu. No caminho, perto da rodoviária, o ônibus encosta para pegar Paulo Isidoro.

Quando chego à Vila Olímpica, o Dawson vem me receber. Me leva até o vestiário e manda me entregarem um uniforme de treino. Antes, pega minha chuteira, marca Olé, olha as travas, de borracha, e dispara.

-Isso não é chuteira, não pega ninguém. Vamos trocar isso. Tem de ser trava de rosca.

Treino na segunda, terça, quarta, quinta. Na sexta, o Dawson me chama para conversar.

– Você vai ficar. Vai ser útil. Joga na lateral-direita, de zagueiro e volante. O Alves, lateral, vai subir ano que vem. Vou precisar de você.

Fiquei entusiasmado, mas lembrei que estava no segundo ano científico. E que no ano seguinte seria o último antes do vestibular. Perguntei se não poderia treinar no infanto-juvenil, que era à tarde, e jogar no juvenil. Sua resposta:

– Ficou louco? Vai estudar à noite!

Fui para casa e falei para o meu pai. Pedi para arranjar um teste no Cruzeiro, ou então, seguiria no Villa mesmo, apesar de ter de ir a Nova Lima três vezes na semana.

Nunca mais voltei. Sequer fui agradecer. Fiquei mais um tempo no Villa e jogava futebol de salão, hoje futsal, no Olympico. Preferi ficar lá. Depois, fui para o Comercial, do Vera Cruz, e para o Pompeia. Fiz vestibular e acabei me formando jornalista.

No ano seguinte à minha decisão, o Atlético foi bicampeão da Taça Cidade de São Paulo. Poderia ter estado lá, mas não me arrependo.

Esportes

Ivan Drummond

Jornalista, cronista esportivo e cobriu as sete últimas edições dos jogos olímpicos