A guerra do Escola Sem Partido em BH
Após boicote de vereadores e bate boca entre manifestantes, apreciação do projeto em sua última comissão é adiada para o dia 18
por Lucas Simões (texto e fotos)
A discussão sobre o controverso projeto Escola Sem Partido, considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), está longe de ter fim em Belo Horizonte. Na manhã desta quarta-feira (11/10), o vereador Mateus Simões (Novo) não conseguiu dar seu parecer sobre o PL 274/2017, que institui na capital mineira o projeto. Ele sofreu um boicote de parte dos vereadores que integram a comissão titular de análise do projeto na Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor.
Em uma ação conjunta, Áurea Carolina (PSOL) e Pedro Patrus (PT), ambos integrantes da comissão titular que analisa o Escola Sem Partido, não compareceram à apreciação do PL no Plenário Helvécio Arantes, em sessão marcada para as 10h. Apenas Juninho Los Hermanos (PSDB), também integrante titular da comissão, e o vereador Irlan Melo (PR), estiveram presentes. Sem quórum, a apreciação acabou adiada para a quarta-feira que vem, dia 18.
A vereadora Áurea Carolina justificou sua decisão ao dizer que não houve tempo para analisar o parecer do relator, publicado apenas nesta terça-feira (10/10) à noite, e nem as três emendas propostas por Mateus Simões. “O parecer foi protocolado ontem à noite com as emendas e a gente não teve tempo para analisar. Já temos uma posição contrária ao projeto por princípios. Mas, a gente queria fazer uma discussão mais qualificada, com tempo e com a mobilização da sociedade civil. Não pode ser de um dia para o outro”, disse Áurea.
O vereador Mateus Simões, a favor do projeto, disse que esperava pela manobra regimental dos vereadores contrários ao PL, mas que a ação “não vai inviabilizar a discussão”. Ele explicou as três alterações que propôs ao PL 274/2017, como a restrição para a aplicação do Escola Sem Partido apenas em escolas públicas — diferente da redação original do projeto de Fernando Borja (PTdoB), que previa a implementação da proposta em toda a rede de ensino da capital.
“Alterei a redação do artigo primeiro porque é o artigo que fala sobre educação em toda a cidade de Belo Horizonte. Mas, na verdade, só podemos legislar sobre a educação pública. Então, o PL só vale para escolas infantis, de ensino fundamental e médio, mas públicas. As privadas e o ensino superior, obviamente ficam de fora”, disse.
Além disso, o parlamentar também alterou o artigo segundo do texto, que dispõe sobre a não-interferência na orientação sexual de crianças nas escolas. “O texto estava confuso. O artigo era muito longo e acabava tomando uma conotação pouco precisa que julgo até perigosa, porque pode beirar o preconceito. Fiz uma redução muito grande no artigo, simplesmente para dizer que a escola não deve interferir na orientação sexual das crianças e adolescentes. E isso não tem nada a ver com educação sexual, que pode ser dada nas aulas normalmente”, completou o vereador.
A última alteração proposta por Mateus Simões diz respeito à afixação de cartazes nas salas de aula e corredores das escolas, advertido para as penalidades, direitos e deveres previstos no projeto Escola Sem Partido. “Não acredito que os cartazes resolvam o problema. Acho um exagero essa exposição. Mas, a ideia de que a escola não pode ser usada como espaço de promoção doutrinária, me parece adequada”, completou.
Clima tenso
Mesmo sem sessão no Plenário Helvéio Arantes, dezenas de apoiadores e críticos do Escola Sem Partido discutiram nos corredores da Câmara Municipal. Dois seguranças precisaram intervir quando um grupo de religiosos se irritou com o pastor José Barbosa, da Frente de Evangélicos Pelo Estado de Direito, contrário ao PL. “Eles começaram a me atacar, vieram para cima, enquanto eu propunha um diálogo. Disseram que me viram na Funarte, no Palácio das Artes, que sou esquerdista. É difícil”, disse o pastor, também contrário às tentativas de censura recentes da arte na capital mineira.
Na saída da Câmara Municipal, um dos apoiadores do Escola Sem Partido, Raimundo Oliveira, criticou o boicote à apreciação da proposta. “Existe um grupo de professores que querem continuar doutrinando nossas crianças. Desconstruindo sexualidades, falando só de um projeto político. Então, o projeto é um instrumento que vem impedir isso. A educação tem que ser baseada nos valores e princípios. Quanto à votação, já estamos acostumados. Porque em todas as comissões, os vereadores eles nunca estão presentes. Qual o medo de discutir?”, questionou Raimundo, que disse pertencer à “vários movimentos”, mas não quis citar nenhum deles.
Situação
O projeto Escola Sem Partido foi apreciado na Comissão de Constituição e Justiça, onde recebeu parecer favorável do relator Irlan Melo (PR), Mas, na Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo, a proposta foi rejeitada pelo relator Gilson Reis (PCdoB).
A última apreciação será a da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor, com relatoria de Mateus Simões (Novo). Após a análise, o projeto segue para votação em plenário, onde precisa da maioria simples, ou seja, 21 votos dos parlamentares, para ser aprovado em votações realizadas em dois turnos. Este é exatamente o número de parlamentares que assinaram a proposta do PL original, sendo a maioria deles da chamada bancada cristã.