Mulheres morrem


Por Silvana Mascagna

“As mulheres têm medo de morrer com pouca idade”, acreditava o autor da chacina em Campinas, que nos últimos minutos de 2016 deu sua contribuição para tornar aquele ano ainda mais macabro, matando 12 pessoas, inclusive o filho e a ex-mulher.

Se pudesse, lhe diria que as mulheres têm medo de morrer crianças. As mulheres têm medo de morrer adolescentes. As mulheres têm medo de morrer na meia-idade. As mulheres têm medo de morrer velhas…

As mulheres têm medo de morrer de causas que os homens não morrem.

E Isamara, de 41 anos, Liliane, de 44 anos, Alessandra, de 40 anos, Antonia, de 62 anos, Abadia, de 56 anos, Ana Luzia, de 52 anos, Larissa, de 24 anos, Luzia, de 85 anos, e Carolina, de 26 anos, são a prova disso. Todas elas, de idades diferentes, morreram vítimas do feminicídio.

“Eu tentei pegar a vadia no almoço do Natal e dia da minha visita, assim pegaria o máximo de vadias da família, mas como não tenho prática não consegui.”

“Tenho raiva das vadias que se proliferam e muito a cada dia se beneficiando da lei vadia da penha!”

As frases escritas pelo assassino em várias cartas que ele deixou escancaram um tipo de crime que mata 4,8 a cada 100 mil mulheres no Brasil – a quinta maior taxa no mundo, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Do total de feminicídios registrados em 2013, 33,2% foram cometidos por parceiros ou ex-parceiros das vítimas.

Esses números mostram uma realidade cruel. Mulheres morrem por serem mulheres. E Isso tem nome: feminicídio.

O feminicídio é considerado crime no Brasil desde março de 2015. “Este odioso crime terá penas mais duras. Esta medida faz parte da política de tolerância zero em relação à violência contra a mulher brasileira”, disse Dilma Rousseff (a quem o criminoso de Campinas também chamou de “vadia”), quando sancionou a lei.

Uma vitória. Mas não basta. Porque, antes, é preciso desconstruir o machismo que mata. Se faz necessário uma mudança estrutural em que toda a sociedade esteja envolvida para acabar com a cultura que subjuga a mulher em todas as esferas.

É necessário repudiar cada ato que nos condena a todas a sermos culpadas mesmo quando somos vítimas. Da mesma forma que a garota de 16 anos estuprada por mais de 30 homens, Isamara também foi culpabilizada pela tragédia em Campinas.

A professora Dany Lima lançou uma proposta para um curso de férias para tratar do tema. A ideia era discutir “questões em torno dos estereótipos de gênero, do que é ser menino e do que é ser menina, essas construções sociais que tanto aprisionam as crianças desde muito cedo”, como ela explicou em seu post no Facebook. Como educadora, ela acredita “na necessidade de mudança dessa sociedade tão injusta, machista, opressora, desigual, que nos aprisiona e mata todos os dias”.

O retorno que ela recebeu? Ameaças de morte a ela e a sua família. Xingada de “vaca, puta, vadia, comunista e destruidora de famílias”, Dany afirma que não vai se calar. “A violência e o discurso de ódio que despejaram sobre esta proposta mostra o quanto ela é necessária e urgente neste momento”, escreveu ela.

Dany faz um convite a todas nós para que continuemos lutando.

É isso!!! Vamos???

Crônicas

Silvana Mascagna

Jornalista paulista, que escolheu Belo Horizonte há 20 anos para viver