Religiosos e conservadores unidos contra a arte

Evangélicos, católicos, grupos organizados pelo impeachment de Dilma Rousseff, jovens do grupo Direita Minas e apoiadores de Bolsonaro somaram 350 pessoas na maior manifestação contra a exposição de Pedro Moraleida, no Palácio das Artes


por Lucas Simões (texto e fotos)

Foto: Lucas Simões

Na maior manifestação contra a arte em Belo Horizonte até o momento, pelo menos 350 pessoas encheram a portaria do Palácio das Artes na noite desta terça-feira (10/10), segundo estimativa da Polícia Militar (PM). O enredo seguiu o mesmo dos últimos dias: acusações de apologia à pedofilia, zoofilia e cristofobia pesaram sobre a exposição de Pedro Moraleida, “Faça Você Mesmo Sua Capela Sistina”. Desta vez, um fato curioso: evangélicos, católicos, grupos organizados pelo impeachment de Dilma Rousseff, jovens da Direita Minas e apoiadores de Bolsonaro se uniram na manifestação.

Enquanto os cristãos, defensores “da família tradicional” e jovens de direita se mantiveram na porta do Palácio das Artes, lá dentro, uma fila se manteve enorme a noite inteira para prestigiar a exposição na Galeria Alberto da Veiga Guignard. Apenas 10 pessoas de cada vez foram autorizadas a visitar a mostra, segundo orientação da Fundação Clóvis Salgado (FCS). E isso propiciou um cenário de provocações, bate bocas e muito nervosismo entre apoiadores e críticos da mostra de arte, que ficaram frente a frente o tempo inteiro.

Religioso contrário à exposição no Palácio das Artes entrevista manifestante a favor da mostra de Pedro Moraleida.

A Polícia Militar, com um efetivo de 20 policiais, marcou presença temporariamente na linha de fogo que separava os manifestantes na porta do Palácio das Artes. Mas acompanhou a maioria das provocações à distância, do canteiro central da avenida Afonso Pena. 

Diego Ferreira, do grupo Direita Minas, puxou coros de “pedofilia não é arte” e uma oração das várias orações realizadas pelos religiosos. Ele disse que o grupo pretende fazer uma ação ininterrupta nas próximas semanas. “Nós estamos indignados e não vamos ficar em casa. Isso não é coisa de criança, é um incentivo para a pedofilia, não vamos permitir. Não queremos isso na nossa cidade”, disse o jovem, de 29 anos.

Dezenas de religiosos realizaram orações de joelhos na escadaria do Palácio das Artes, em protesto à exposição de Pedro Moraleida

Respondendo aos críticos da exposição, a aposentada Carmem Alvarenga, 72, entoou gritos de “fascistas” e “Estado laico”. E bateu boca, aos gritos, com muitos dos religiosos. “Eu não achei que fosse viver para ver uma coisa que eu vi na ditadura militar. É exatamente o mesmo clima, por isso não aguentei calada. Essas pessoas não fazem ideia do que é arte, e muito menos do que é uma democracia. Mas acharam um palanque para se promover”, disse a aposentada.

Bastante exaltado, o vereador Jair di Gregório (PP) apareceu na manifestação e, aos berros, repudiou o trabalho de Pedro Moraleida, artista mineiro morto em 1999, ainda aos 22 anos de idade. “Não não vamos desistir de acabar com esse crime à cidade. Pedro Moraleida é um lixo!”, esbravejou o vereador. 

 

Vereador Jair Di Gregório se referiu ao artista Pedro Moraleida como “lixo”

 

Questionado sobre a falsa acusação que fez a professora de educação básica Raquel Sousa, ao gravar um vídeo que induz a presença dela e de crianças na exposição, o parlamentar se irritou ainda mais. “Chega desse mimimi. Eu já expliquei tudo, não difamei ninguém. E digo mais: a professora estava numa mostra de filmes, como disse, mas dezenas de crianças circularam pelo Palácio das Artes e passaram na porta da exposição, ficaram expostas”, tentou se justificar o vereador.

Por volta das 20h, a maior parte dos manifestantes se dissipou. Carregando cruzes, imagens de Nossa Senhora, Bíblias e enormes faixas com dizeres como “pedofilia não é arte”, dezenas deles foram embora em um mesmo ônibus. Diego Ferreira, do Direita Minas, confirmou que os manifestantes se uniram para “ir e voltar juntos”, mas não soube dizer quem fretou o veículo. “Não sei de quem foi a ideia, mas muitos vieram juntos para facilitar mesmo, chegar junto, dar mais apoio. Nós queremos nos fortalecer”, completou.