Juristas se unem pela democracia em BH
Às vésperas do julgamento de Lula, Comitê Mineiro de Juristas pela Democracia inaugura movimento com centenas de membros em Minas Gerias. Intenção é discutir e denunciar a fragilidade da democracia brasileira nos tribunais, universidades e escritórios de advocacia.
por Lucas Simões
Enquanto milhares de pessoas se dirigem a Porto Alegre para apoiar Lula, juristas do país inteiro têm se organizado para uma ampla defesa da democracia, numa perspectiva que vai além do decisivo julgamento desta quarta-feira (24/01). Assim como em outras capitais, Belo Horizonte inaugurou nesta terça-feira (23/01) o Comitê Mineiro de Juristas Pela Democracia, uma frente que começa a levar para escritórios de advocacia, tribunais e salas de aula universitárias a realidade do pior momento da democracia brasileira desde a ditadura civil-militar.
O clima de incerteza entre condenação e absolvição que paira sobre a República de Curitiba é só “A ponta de um gigantesco iceberg antidemocrático.”, segundo a advogada Carolina Lobo, da AJDC — Advogados e Advogadas pela Democracia, Justiça e Cidadania, organização sem fins lucrativos criada ainda em 1991 para defender a atuação de juízes no âmbito dos direitos humanos.
“Nós vamos sair daqui hoje para cada sala de aula, escritório, tribunal e explanar o que está acontecendo, fazer frente em cada processo que tivermos nas mãos para mostrar como a democracia está debilitada. Independente do resultado do dia 24, a absolvição (de Lula) virá pela história.”, disse Carolina, aplaudida por um auditório lotado na Sala da Congregação, na Faculdade de Direito da UFMG, com a presença maciça de juristas, advogados, estudantes, políticos e militantes.
O advogado criminal Leonardo Isaac Yarochewsky, professor demitido da PUC-MG em novembro de 2016 por condenar o impeachment de Dilma Roussef, publicando livros como “Tchau, Querida Democracia”, foi categórico ao afirmar que “Nunca viu nada igual em 30 anos de advocacia.”. Para ele, o Comitê de Juristas Pela Democracia tem a ampla função de não só apontar as arbitrariedades políticas e jurídicas do processo contra Lula, mas também de criar discussões permanentes no direito brasileiro.
“Essa situação vai muito além da questão criminal e do processo contra Lula. Por isso publicamos livros, organizamos palestras, fizemos parcerias com renomados juristas internacionais que também denunciam a fragilidade da democracia brasileira neste momento. E isso incomoda porque é algo que cria raízes para uma discussão permanente. Tanto que vimos recentemente perseguições a professores universitários, perseguições a grupos de estudos de esquerda e até mesmo a livros escritos para denunciar o golpe. Nossa função é fazer o máximo de barulho daqui pra frente, para que o direito não seja vítima de novo do fascismo e de juristas que se identificam com essa linha antidemocrática de pensar e agir. Tem que haver críticas e discussão a advogados e juízes que agem assim.”, disse Leonardo.
Uma crítica que atinge diretamente a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A entidade apoiou o golpe civil-militar de 1964, se arrependeu posteriormente, mas decidiu defender com unhas e dentes o processo de impeachment contra Dilma Roussef, em 2016. “Eu estou aqui como crítico da OAB e também como representante de uma parcela da entidade que não se curvou ao golpe. É preciso denunciar as posturas da OAB para que a história não seja lembrada apenas anos depois, e que as desculpas venham décadas mais para frente, como foi com a ditadura.”, defendeu Daniel Murad, conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais (OAB-MG).
Nesta terça-feira (23/01), milhares de atos em defesa de Lula e da democracia foram convocados pelo país inteiro, inflamando ainda mais o clima tenso para o julgamento do ex-presidente. Em Belo Horizonte, a concentração da manifestação acontece na Praça Afonso Arinos, no centro, a partir das 18h.