Universidades federais na UTI
Cortes de verbas pode levar ao fechamento de 20 universidades no país já no próximo mês
Por Lucas Simões
Obras paradas, bolsas de pesquisa suspensas, prédios sem luz e até impressoras sem tinta. Tentando frear os cortes do Governo Federal que ameaçam interromper e até fechar universidades e institutos federais já no mês que vem, a Frente Parlamentar pela Valorização das Universidades Federais, presidida pela deputada federal Margarida Salomão (PT-MG), começou na semana passada a divulgar dados e análises a respeito do desmonte do ensino superior promovido no governo Michel Temer.
Em assembleia realizada na Faculdade de Direito da UFMG, o Sindicato dos Trabalhadores das Instituições Federais de Ensino (Sindifes-MG) fez uma paralisação simbólica e não descartou a possibilidade de uma greve nacional, a ser discutida neste fim de semana, em encontro realizado em Recife, com reitores de outras universidades federais do país.
“Realizamos uma primeira paralisação para chamar a atenção e neste fim de semana voltamos a discutir o assunto com reitores de todas as federais. Por que chegamos ao limite, literalmente. Em outubro, muitas universidades simplesmente vão fechar as portas”, disse a diretora do Sindifes, Cristina Del Papa.
O movimento acontece duas semanas após o Ministério da Educação (MEC) anunciar a liberação de R$ 1 bilhão para socorrer as instituições de ensino superior federais, medida vista como “ludibriosa” pela deputada Margarida Salomão, ex-reitora da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Ela alega que o montante anunciado pelo ministro Mendonça Filho, em 6 de setembro, não é real porque pelo menos metade desse dinheiro foi comprometido em meses anteriores, com as despesas de custeio, que incluem contas de água, luz e o salário de funcionários terceirizados, além dos chamados gastos de investimento, destinados para obras de expansão e reforma nos prédios das instituições.
“Não há R$ 1 bilhão a mais para universidades federais, isso é uma fábula. O que acontece é que metade desse valor, um montante de R$ 558, 69 milhões, é referente a despesas de meses anteriores, já feitas, autorizadas pelo MEC, e que precisavam ser honradas. O governo simplesmente disse que deu R$ 1 bilhão, mas metade desse valor é para sanar dívidas. Então, é como se você desse uma esmola diante de uma situação caótica que não chega perto da necessidade real das instituições”, diz Margarida.
Segundo a deputada, o Governo Federal liberou na realidade apenas R$ 449,6 milhões a mais para as 63 universidades e 38 institutos federais. Um valor considerado irrisório diante dos drásticos cortes, que já chegam a R$ 3,6 bilhões na pasta do MEC, além de outros R$ 700 milhões a menos para a educação superior oriundos de emendas parlamentares aprovadas no Congresso.
Para Jacob Paiva, secretário do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), esse cenário tende a se agravar. Ele avalia que um universo de 15 a 20 universidades no país terão que “paralisar totalmente suas atividades” a partir de outubro, com risco de suspensão de projetos e não-pagamento de funcionários e custeios básicos.
“A UFRN já cortou quase pela metade gastos com limpeza e segurança. NA UFRJ, o corte de energia é uma realidade e a universidade está na lista das que não teriam como funcionar depois de setembro. Na UnB, quase 200 funcionários foram demitidos. As universidades têm direito a receber 100% do valor contingenciado, porque é o mínimo para atravessar essa crise, quitar pagamentos, conseguir fechar o ano. Mas o governo insiste em não liberar os recursos. Está fazendo essas instituições agonizarem mês a mês”, diz Jacob.
Até agora, o MEC liberou apenas 75% do orçamento de custeio e 45% do orçamento de capital para as universidades e institutos federais do país. Segundo o ministro Mendonça Filho, o Governo Federal irá aumentar esse limite para 85% para despesas de custeio e 60% para despesas de capital, mas sem chegar a 100% dos valores. “Isso tudo com uma inflação de 6,28% em um ano. Não temos a mínima condição de continuar assim”, completa Jacob.
Desmonte mineiro
Em Minas Gerais, Estado com o maior número de universidades federais do Brasil, abrigando 17 instituições de ensino superior, incluindo os institutos federais, a situação também é crítica. Por isso, a deputada Margarida Salomão tem a intenção de promover debates em 95 municípios do Estado das áreas sob influência de universidades e instituições federais. Ela apresentou a proposta em audiência pública realizada na semana passada, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
“Muitas cidades do interior têm vida econômica e social conectada com a universidade. Se a gente desmonta esses espaços de ensino, afetamos diretamente milhares de vidas e empregos e uma relação cultural muito forte também”, diz a deputada.
Somente a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) deixou de receber, até o momento, R$ 770 milhões do Governo Federal. O orçamento deste ano é 10% menor do que em 2016 — são R$ 173,2 em milhões em caixa agora, contra R$ 191,8 milhões ano passado.
“Existe uma situação real de desespero. Quase dez obras paradas no campus da Pampulha, contas de luz ameaçadas. Falta até tinta nas impressoras de alguns departamentos. E a UFMG tem 15% do orçamento contingenciado sem previsão de liberação”, diz Neide Dantas, coordenadora do Sindifes-MG.
No campus da Pampulha, o reitor da UFMG, Jairo Arturo Ramírez, confirmou a paralisação das obras no Centro de Transferência e Inovação Tecnológica (CTIT), no Instituto de Ciências Exatas, no Centro de Atividades Didáticas III, além dos anexos da Faculdade de Educação, do Departamento de Química (3A) e das escolas de Música e Belas Artes.
Já na unidade de Montes Claros, no Norte de Minas, foram paralisadas obras do segundo pavimento do Centro de Pesquisa em Ciências Agrárias (CPA) e em uma ala do Centro de Atividades Administrativas e Didáticas (CAAD).
Nas outras regiões do Estado, a situação não é menos angustiante, segundo levantamento da Frente Parlamentar pela Valorização das Universidades Federais em parceria com a Andifes — Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior no Brasil.
Na região Central de Minas, a Universidade Federal de Ouro Preto deixou de receber R$ 162 milhões até o momento. Na Zona da Mata e das Vertentes, o contingenciamento na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) chegou a R$ 486 milhões, e a R$136 milhões na Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ).
No Triângulo Mineiro, estão congelados R$ 376 milhões da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e R$ 127 milhões da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM).
No Sul de Minas, a Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI) tem limitados R$ 89 milhões do orçamento e a Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL), R$ 85,7 milhões à espera de liberação. Fechando o levantamento, a Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) não recebeu um montante de R$ 98 milhões.